Quem foi Jaguar? O cartunista irreverente marcou a história do humor e do jornalismo brasileiro

O Brasil perdeu, neste domingo (24), um de seus maiores nomes do cartum e do humor gráfico. Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, conhecido nacionalmente como Jaguar, morreu no Rio de Janeiro aos 93 anos, em decorrência de complicações de uma infecção respiratória. O artista estava internado no Hospital Copa D’Or, onde vinha recebendo cuidados paliativos.

A morte de Jaguar encerra uma trajetória de mais de sete décadas dedicada à crítica social, ao humor irreverente e à ousadia política. Para muitos de seus colegas e admiradores, ele deixa um legado insubstituível para a cultura e para a liberdade de expressão no Brasil.

Primeiros traços e o nascimento de “Jaguar”

Nascido no Rio de Janeiro em 1932, Jaguar começou sua carreira ainda jovem, conciliando o trabalho de escriturário no Banco do Brasil com a paixão pelo desenho. Seu primeiro cartum foi publicado em 1952, na coluna de humor Penúltima Hora, do jornal Última Hora. Pouco tempo depois, passou a colaborar com a revista Manchete.

O pseudônimo que o eternizou foi sugestão de um amigo cartunista, Borjalo, e rapidamente se tornou sinônimo de ousadia e contestação.

O Pasquim e o rato Sig

O ponto alto de sua carreira veio em 1969, quando Jaguar se tornou um dos fundadores de O Pasquim, semanário satírico que marcou a resistência cultural durante a ditadura militar. Ao lado de nomes como Tarso de Castro, Sérgio Cabral, Henfil, Millôr Fernandes, Ziraldo e Paulo Francis, Jaguar transformou o jornal em trincheira contra a censura e a repressão.

Foi nesse período que nasceu seu personagem mais famoso, o rato Sig, inspirado em Sigmund Freud. O ratinho irreverente virou mascote do jornal e símbolo da resistência bem-humorada ao autoritarismo. Jaguar enfrentou prisões e processos, mas nunca abandonou sua verve crítica.

Entre personagens e projetos

Além de Sig, Jaguar criou outros personagens emblemáticos, como Gastão, o vomitador, Boris, o homem tronco, e o cartum Chopnics. Sua produção foi marcada pelo humor ácido, pelo traço inconfundível e pelo olhar contestador sobre a política e os costumes brasileiros.

Nos anos 1990, voltou ao jornalismo satírico com a revista Bundas, ao lado de Ziraldo e outros parceiros de O Pasquim. Também se dedicou à literatura de memórias, publicando livros como Ipanema – Se Não Me Falha a Memória (2000) e Confesso que Bebi, Memórias de um Amnésico Alcoólico (2001), onde misturou relatos pessoais, reflexões sobre a boemia carioca e sua vivência cultural.

Vida pessoal e legado

Jaguar foi casado com a poeta Olga Savary, com quem teve dois filhos: a escritora Flávia Savary e Pedro Jaguaribe, falecido em 1999. Nos últimos anos, viveu ao lado da médica Célia Regina Pierantoni.

A notícia de sua morte mobilizou homenagens nas redes sociais. O chargista Angeli o chamou de “o maior” e dono do traço mais rebelde do cartum brasileiro. Laerte Coutinho se referiu a ele como “mestre querido”, enquanto Chico Caruso destacou a perda irreparável para o humor e para o país.

A irreverência como marca

Mais do que um cartunista, Jaguar foi símbolo de uma geração que acreditou no poder do humor como ferramenta de crítica e transformação social. Sua irreverência, muitas vezes desconfortável para os poderosos, ajudou a abrir espaço para o pensamento livre e criativo em tempos de repressão.

A trajetória de Jaguar é, portanto, a história de um artista que nunca se rendeu, que encontrou no riso uma forma de resistência e que deixou, no papel e na memória coletiva, a marca indelével de sua genialidade.

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